domingo, 23 de dezembro de 2018

CARTA ABERTA AO GOVERNADOR ELEITO: em nome da Criaturada grande de Dalcídio.

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Belém do Pará, 23 de dezembro de 2013. 

Excelentíssimo SenhoHelder Zahluth Barbalho:



BOAS FESTAS E FELIZ ANO NOVO. 


Como o senhor está a par do noticiário da imprensa, O Nosso Museu do Marajó em Cachoeira do Arari fechou as portas por falta de manutenção, risco de incêndio e desabamento devido a várias infiltrações de chuva, segundo laudo técnico dos Bombeiros acionados pelo Ministério Público Estadual (MPE) em acordo com a Diretoria do referido Museu. A comunidade teme que eventual demora de recursos resulte ainda em maior prejuízo para o turismo cultural do município e microrregião Arari, numa hora em que emprego e renda local fazem a diferença.

De longa data, acompanho as atividades do MdM como amigo de Giovanni Gallo desde fins de 1994 e voluntário a partir de 2003, após o falecimento do fundador. Ademais, sou nativo de Ponta de Pedras (Ilha do Marajó) e sobrinho por parte paterna do escritor de "Chove nos campos de Cachoeira", aos 81 anos de idade me sinto na obrigação de colaborar em tudo que seja possível para o bem viver da gente marajoara.

Em 1983, o prédio do MdM se encontrava em ruína abandonado pela empresa Oleaginosas de Cachoeira do Arari (OLEICA), com dívida de financiamento junto ao Banco da Amazônia, quando foi adaptado para servir de sede ao museu transferido de Santa Cruz do Arari, numa operação assistida pelo governo estadual durante gestão de Jader Barbalho que possibilitou venda das instalações do MdM em Santa Cruz do Arari e resgate da dívida da OLEICA. Na prática, uma permuta avalizada pelo governo do Estado: dizendo isto como precedente para a intervenção necessária. O museu instalado em Cachoeira do Arari no mesmo ano do Sesquicentenário da cidade (1983) foi reinaugurado em 1984. 

A possível parceria estratégica que poderia ter sido feita em 1983 - Comunidade-Museu - Município - Estado -, deixou de ser formalizada mediante protocolo. Oxalá agora, sob seu governo venha a acontecer para o bem não apenas de Cachoeira, mas também de todos municípios integrados na Associação dos Municípios do Marajó (AMAM) através de rede de extensão de ecomuseus e museus comunitários da mesorregião Marajó.

Em 34 anos, as instalações do MdM em Cachoeira do Arari tiveram apenas ligeiro conserto de estrutura do telhado, cerca de 2010. Ocasião quando irrompeu grave desacordo interno levado à lide judiciária, que acabou pelo afastando da antiga diretoria e rompimento de amizade com importantes colaboradores ligados ao Museu Goeldi, inclusive que vinha dando ajuda indispensável. Decorridos oito anos daquele infausto acontecimento, finalmente foi eleita diretoria de consenso e pacificados os associado. Porém, já o tempo pediu providências urgentes para evitar a ruína do museu que o padre Gallo inventou às margens do lago Arari, em 1973. 

Por certo, inúmeros amigos e amigas do Museu do Marajó estão pedindo sua atenção para o drama deste nosso museu comunitário, o mais significativo da cultura marajoara na grande ilha. Portanto não quero roubar vosso precioso tempo para chover no molhado, mas sim solicitar um olhar especial pela gente que foi o motivo principal de criação do museu. 

Tenho certeza de que já estarão anotadas providências imediatas para fazer os reparos necessários a fim do museu voltar a atender o público no importante município do Polo Turístico Marajó. Entretanto, com sua cordial benevolência ousarei falar em nome da Criaturada grande de Dalcídio Jurandir - que são as populações tradicionais das Ilhas, Baixo Amazonas, Marajó e Belém retratadas na série literária Extremo-Norte, que deu o Prêmio Machado de Assis (1972), da Academia Brasileira de Letras (ABL), ao autor paraense até hoje único romancista da Amazônia destacado pela dita premiação.

É claro que se vivos fossem Dalcídio Jurandir (Ponta de Pedras, 1909 - Rio de Janeiro, 1979) e Giovanni Gallo (Turim, 1927 - Belém, 2003) este caboco que vos fala não precisaria sair de seu canto de subúrbio para manifestar os cuidados de mais de 200 mil marajoaras que ainda não sabem ler nem escrever. Um museu para analfabetos? Pois foi esse museu alfabetizador, sim, que o padre dos pescadores fez! Como nós não sabemos!





Para estes analfabetos de pai e mãe e para outros também mal sabendo rabiscar e soletrar, o padre Giovanni Gallo inventou um criativo método de "ver com a ponta dos dedos". É uma maneira expedita de fazer "cegos" enxergar aquilo mesmo que eles estão cegos de tanto ver, como diria o padre Antônio Vieira em seu "Sermão aos Peixes" (1654), em São Luís do Maranhão, quase fugindo dos colonos iracundos do Grão-Pará para ir pedir ao rei de Portugal a lei de abolição dos cativeiros dos índios (1655). 

Não carece repetir que a tal lei real nunca foi deveras aplicada e que ainda hoje perdura o trabalho escravo em nossas regiões periféricas, tanto no meio rural quanto no meio urbano. Embora tenha sido historicamente com base na lei de abolição dos cativeiros que o 'padre grande dos índios' alcançou a paz com os rebeldes Nheengaíbas (Marajoaras), em Mapuá (Breves), no dia 27 de agosto de 1659. Deste acordo de paz, escreveu o padre ao rei dom Afonso VI, ficou o Pará seguro da cobiça estrangeira (carta de 29/11/1659 - publicada em 11/02/1660). 

Em suma, Senhor Governador, para esta gente à margem da História o museu em apreço é uma tábua de salvação. O Estado deve colocar aí sua mão, mas conservar o caráter comunitário dele. Convidar oficialmente a Associação Brasileira de Ecomuseus e Museus Comunitários (ABREMC) a participar do mutirão será um atalho para chegar ao IBRAM. Por arremate, o Senhor Governador poderá examinar junto à SECULT possibilidade de remanejar projeto de reconstrução da casa do escritor Dalcídio Jurandir em Cachoeira do Arari, que se acha arquivado, para o edificar em espaço turístico e cultural anexo ao Museu do Marajó.

São estas preocupações que me trazem à presença de Vossa Excelência às vésperas de natal, pelas quais ficaremos eternamente gratos se poderem ser levadas em consideração em nome da Criaturada grande de Dalcídio, 

Saudações marajoaras!
José Varella Pereira.   


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ARCO DO SESQUICENTENÁRIO DE CACHOEIRA DO ARARI,
ANO DA MUDANÇA DE SEDE DO MUSEU DO MARAJÓ.
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sábado, 22 de dezembro de 2018

AÇÃO COLETIVA EM DEFESA DO MUSEU DO MARAJÓ, DA AMAZÔNIA MARAJOARA E DO ESTADO DO PARÁ.



"Em Janeiro de 2009, Cachoeira do Arari homenageou DALCÍDIO JURANDIR, pelo seu centenário de nascimento, com uma caminhada muito animada com cantorias com Ronaldo Silva, as crianças  com seus instrumentos rústicos e contando com a ajuda de muitas outras pessoas para chegar até a casa onde morou o maior romancista da Amazônia onde foi feita a homenagem final. Registrei minha presença na janela de Dalcídio, aliás eu e meu neto Bruno. Este ano na Semana Santa,estive em Cachoeira e pra meu espanto, da casa não restou nada além de mato, embora tenha sido tombada pelo Governo  do nosso Estado" 

Marli Braga Dias, blog Encanto Caboclo.




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O chalé original retratado nas paginas do romance
seminal "Chove nos campos de Cachoeira", de Dalcídio
Jurandir. Objeto de projeto para reconstrução pelo
Departamento de Patrimônio Histórico, Artístico
e Cultural, da SECULT-PA. 





CERTIDÃO DE TOMBAMENTO
NÚMERO DE PUBLICAÇÃO: 192270
GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ
SECRETARIA DE ESTADO DE CULTURA
DIRETORIA DE PATRIMÔNIO
DEPARTAMENTO DE PATRIMÔNIO HISTÓRICO
ARTÍSTICO E CULTURAL
CERTIDÃO DE TOMBAMENTO


De acordo com a Lei Estadual n° 5.629 de 20.12.1990, que "dispõe sobre a preservação e
proteção do patrimônio histórico, artístico, natural e cultural do Estado do Pará", a partir da
presente data fica TOMBADO sob a denominação "Antiga Residência do Escritor
Dalcídio Jurandir" o bem imóvel sito à Avenida Coronel Bento Miranda, n° 621, esquina
com a Travessa Alfredo Pereira, bairro de Petrópolis, município de Cachoeira do Arari,
Arquipélago do Marajó, Estado do Pará.
O tombamento, na forma da Lei, deverá ser inscrito no Livro Tombo n° 03 -Livro de bens
imóveis de valor histórico, arquitetônico, urbanístico, rural, paisagístico,
como: obras, cidades, edifícios e sítios urbanos ou rurais , pertencente ao
Departamento de Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (DPHAC), da Secretaria de
Estado de Cultura (SECULT).
O bem tombado terá área de entorno definida por raio de 100m, medidos a partir do limite
do terreno onde o imóvel está localizado, conforme dispõe a Lei Estadual n° 5.629/1990,
art. 30, parágrafo único.
Publique-se e cumpra-se.
Secretaria de Estado de Cultura, 14 de dezembro de 2010.
LUIZ FLÁVIO MOURA DE CARVALHO
Diretor Departamento De Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural/DPHAC/DPAT/SECULT
LÉLIA MARIA DA SILVA FERNANDES
Diretora de Patrimônio -DPAT/SECULT
Homologo:
CINCINATO MARQUES DE SOUZA JUNIOR
Secretário de Estado de Cultura -SECULT 






TENTATIVA DE PSICOANÁLISE DO 'CARMA' DO MARAJÓ.


A palavra 'carma' vem do sânscrito karma, língua culta da Índia antiga; que significa 'ação'. Ela aparece em textos hinduístas e budistas cerca de 600 anos antes de Jesus Cristo. O carma, pois, se refere ao longo processo histórico de formação e evolução da mãe Terra com todas suas crias, desde o barro dos começos do mundo até os dias de hoje na era do ciberespaço. Numa palavra, o carma é o primitivo nome da História natural e cultural confundidas, para o bem e o mal, na vida de cada criatura...

E o Marajó velho de guerra com isto? 5 mil anos de ocupação humana das terras baixas da América do Sul; 1600 anos da Cultura Marajoara, a primeira ecocivilização da Amazônia contemplam a Criaturada grande de Dalcídio Jurandir! 

Para decifrar o carma marajoara a gente quer fazer parte da cidadania brasileira e do mundo ora em reconstrução. A Área de Proteção Ambiental do Arquipélago do Marajó (APA Marajó) deve ser reconhecida como Reserva da Biosfera Marajó-Amazônia, no Programa Homem e Biosfera (MaB), da UNESCO. Com esta unidade de conservação do bioma fluvial-marítimo amazônico (segunda na Amazônia brasileira e sétima da rede brasileira de reservas da biosfera, em conjunto com os biomas da Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Serra do Cipó, Pantanal e Amazônia Central), as populações tradicionais da Amazônia Marajoara serão chamadas a assumir protagonismo nunca dantes neste país.

Biosfera diz respeito à vida de todos seres da Geosfera, incluindo o Homem. E o conjunto de seres pensantes forma a Noosfera considerada a terceira etapa de existência de nosso planeta: as ações do longo passado da Terra estão sempre presentes e podem eventualmente ser modificadas no futuro. Cada bioma e ecossistema tem vida própria: noutras palavras, 'carma' singular.

Qual a peça mais velha e a mais nova do Museu?

O visitante do Museu do Marajó não deve adentrar à exposição sem antes saber quais são as peças a mais antiga e a mais nova do acervo. O carma individual do viajante, nesse instante, se confundirá com o tecido de ações coletivas que geraram o musēum (templo das musas), lugar sagrado de inspiração e consciência. Consciente do aqui e agora de um museu criado com "cacos de índio" (fragmentos de cerâmica pré-colombiana deixadas ao leu pelo arrombamento e o saque dos 'tesos', sítios arqueológicos), o viajante do mundo há de refletir a respeito de todos os museus do mundo. Para que eles servem? Uma urna marajoara de mais de mil anos de existência pode acordar a consciência da brasilidade para a existência das primeiras nações do gigante da América do Sul.

É claro que as ações individuais do menino italiano Giovanni terminaram por o converter em missionário jesuíta na misteriosa e canibalesca Amazônia (cf. Giovanni Gallo, "O homem que implodiu", autobiografia) e, consciente e inconscientemente, no berço da civilização marajoara ele leva o choque fatal da implosão de sua vida individual de cosmopolita de primeiro mundo para se batizar humildemente caboco nas águas do Arari. Rio de extintas araras 'unas' (azuis)... Quando digo choque do padre dos pescadores na modesta paróquia de Santa Cruz do Arari (ler "Marajó, a ditadura da água) penso eu no carente bairro do Choque, na histórica Cachoeira do Arari onde o padre insubmisso ao bispo e tenaz opositor ao prefeito foi asilar-se. 

Compelido a bater em retirada daquele seu sui-generis eco-museu avant la lettre chamado O Nosso Museu de Santa Cruz do Arari (1973-1981), que viria a surpreender o criador do conceito de ecomuseu, Hugues de Varine. Por acaso, o ecomuseu do lago Arari de fato, veio a ser precursor do museu comunitário O Nosso Museu do Marajó (1981), transferido apressadamente, em 1983, para instalações virando tapera e curral de éguas da falimentar fábrica Oleoginosas de Cachoeira do Arari (OLEICA).

Recebido de braços abertos pelo povo e autoridades, o Museu do Marajó em Cachoeira abriu suas portas em 1984. O padre iria purgar ainda os seus pecados no altar do Museu e finalmente enterrar os seus ossos, em 2003, antes de ser declarado e crismado pelo povo reincarnação de um grande pajé e cacique marajoara. Se o povo português sob inspiração do poeta trovador Bandarra pôde ressuscitar o rei dom Sebastião, por que a curiosa gente marajoara com a fé ancestral do caruanas não poderia operar semelhante prodígio que o antigo fado lhe outorga?

Quem sabe história e geografia da Amazônia Marajoara concorda com a afirmação de que é do Pará a primeira cultura complexa da Amazônia e a arte primeva do Brasil - a Cerâmica Marajoara -, que hoje se acha espalhada por grandes museus nacionais e estrangeiros. Parte desse patrimônio disperso fora da ilha ancestral da amazonidade foi definitivamente perdida no incêndio do Museu Nacional no Rio de Janeiro. Fato que representa uma dupla alienação para a gente marajoara - a Criaturada grande de Dalcídio Jurandir -, despossuída de história e desterrada de seu chão ancestral.

Em 1939, em Salvaterra então pertencente a Soure, o índio sutil ganhador do Prêmio Machado de Assis de 1972; deu início à série literária Extremo Norte, com o romance Chove nos campos de Cachoeira seguido de Marajó. Roteiro literário passando pelas Ilhas, Baixo Amazonas, Belém, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul... O padre Giovanni Gallo sem conhecer Hugues de Varine inventou o nosso primeiro ecomuseu e sem ler Dalcídio criou o inovador museu comunitário da terra adotiva do escritor de "Chove nos campos de Cachoeira". Na juventude, o futuro romancista queria ser enterrado debaixo da árvore Folha Miúda na beira do rio em frente ao chalé, quando morreu (1979) o sepultaram no Rio de Janeiro... Tantos rios na vida desse marajoara fora de série. O padre envelheceu e morreu no chão de Dalcídio, escreveu três livros, plantou um bosque ao lado do museu no qual um pé da idolatrada Folha Miúda, preparou o teso para demonstração aos turistas, que lhe serviu de túmulo. 

Por tudo isto acredito que está mais do que na hora de levantar o Chalé no Choque ao pé do Museu: boa vizinhança entre o romancista da criaturada grande e o padre dos pescadores.


Guia básica para um projeto de remodelação do Museu




Em primeiro lugar, cientes do carma que nos toca como coletividade, carece acordar sobre aonde queremos chegar. Modestos no tamanho da passada, mas ambiciosos do esperançar da chegada do futuro. 


Com esse objetivo em mente, será útil uma agenda a par da AGENDA 2030 dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), a partir de um Protocolo-Quadro entre a Associação O Nosso Museu do Marajó e a Prefeitura Municipal de Cachoeira, possibilitando a esta dotar o MUSEU DO MARAJÓ de orçamento financeiro corrente e representação jurídica com interveniente perante a União, Estado do Pará e organismos internacionais para trato de assunto de interesse do museu;

Mediante o instrumento supracitado, promover concurso para elaboração de projeto contemplando hipótese de repatriamento de cerâmica arqueológica que se acha em museus estrangeiros ou remoção de peças de cerâmica marajoara de museus nacionais para um novo e adaptado Museu do Marajó no futuro;

Reconstrução do chalé de Dalcídio Jurandir no conjunto de equipamentos museológicos do Museu do Marajó para fins de turismo literário, conforme projeto de 2010, que acha no Departamento do Patrimônio Cultural, da Secretaria de Estado de Cultura do Pará (SECULT-PA);

Em convênio com a Associação Brasileira de Ecomuseus e Museus Comunitários (ABREMC), confiar a esta interesses do Museu do Marajó junto ao Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), notadamente para criação de extensão ecomuseal do MdM destinada a envolver o município de Cachoeira do Arari em sua totalidade e os mais municípios marajoaras, sobretudo Soure, Salvaterra, Ponta de Pedras e Santa Cruz do Arari na rota gastronômica do queijo do Marajó.


sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

NOVOS DESAFIOS PARA CONSERVAÇÃO DO MUSEU DO MARAJÓ.

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O tempo não para! O velho galpão da falida fábrica OLEICA, recuperado em mutirão, nos anos 80, para abrigar o museu do padre Gallo em mudança de Santa Cruz do Arari, de mala e cuia, depois de 35 anos dá sinais de que não aguentará mais uma invernada. Cachoeira já tem o trauma de ter deixado o chalé de Dalcídio Jurandir cair ao chão...

O Glorioso São Sebastião não permita esta gente assistir a pior decadência depois da morte do padre Giovanni Gallo (Turim, Itália; 27/04/1927 - Belém do Pará, 07/03/2003); a completar 16 anos de falecimento no próximo ano! Já a estrutura do telhado recebeu conserto uma vez. Porém, agora parece ser inadiável a reforma do prédio principal do conjunto (exposição Giovanni Gallo, reserva técnica arquelógica, albergue, oficina, casa do Gallo e Fazendola), este reclama projeto mais arrojado e, portanto, mais caro. O museu não poderá arcar o custo com seus próprios recursos.

Em Cachoeira do Arari até os pobres moradores do bairro ribeirinho do Choque, vizinho ao museu, sabem que a associação comunitária tem feito das tripas coração a fim de manter as portas do museu abertas ao público. O famoso museu, atrativo turístico número um da cidade; funciona à base de amigos e voluntários apesar de extrema boa vontade da comunidade não tem renda. Desde sua fundação o museu registra crise após crise... Todavia, teimoso como seu criador, resiste e vai sobrevivendo aos invernos na falta de recursos financeiros e de profissionais.

Então, a diretoria recentemente eleita terá que enfrentar novos desafios. Bombeiros teriam sido chamados para avaliar riscos, começando pela insuficiência de extintores de incêndio e o estado geral do prédio da empresa falida construído nos anos 70 com incentivos fiscais da SUDAM. Com a venda da antiga sede do museu em Santa Cruz do Arari ao governo estadual, padre Gallo pôde saldar a dívida deixada pela OLEICA e receber a fábrica para dar lugar ao museu. O que se diz hoje é que o tempo de duração do antigo galpão se acabou (vem aí mais um inverno daqueles retratados no clássico "Chove nos campos de Cachoeira").


O NOSSO MUSEU DO MARAJÓ

Nós todos somos responsáveis pela conservação da obra do padre Giovanni Gallo em Marajó. Isto é, o resgate da memória da Criaturada grande de Dalcídio Jurandir! A cultura do Povo Marajoara, que foi a primeira intenção do padre, em 1973, com a invenção avant la lettre do primeiro ecomuseu brasileiro, O Nosso Museu de Santa Cruz do Arari, precursor do Nosso Museu do Marajó (1981). 








Como bem disse o poeta Carlos Drummond de Andrade, chove nos campos de Cachoeira e Dalcídio Jurandir já morreu... Digo eu agora, chove também sobre a campa do padre Gallo, chove indiferentemente, como a chuva do esquecimento sobre todos mortos do mundo: que permanecerão vivos entre os vivos pelo feito da memória. Se é verdade que a verdadeira morte é o esquecimento, nós queremos ser lembrados pelas futuras gerações como aqueles e aquelas que não deixaram esquecer a história extraordinária do Museu do Marajó. 

Humildemente, suscito ideias estúrdias para que os antigos marajós de mais de mil anos de existência sejam conhecidos do Brasil e do mundo: meu préstimo é deveras insignificante, mas poderá acordar o sol de uma primeira manhã nos campos do Marajó para esta gente que o mundo esqueceu, ver renascer a primeira ECOCIVILIZAÇÃO da Amazônia, na lição fecunda da Amazônia Marajoara, de Denise Schaan e Agenor Sarraf.

Repito, 'ecocivilização' palavra esta que os referidos autores não escreveram na obra, mas eu copio de Ignacy Sachs, economista polonês, naturalizado francês nascido em 1927, mesmo ano em que Giovanni Gallo nasceu; também referido como 'ecossocioeconomista', por sua concepção de desenvolvimento como uma combinação de crescimento econômico, aumento igualitário do bem-estar social e preservação ambiental. Quer dizer, consultando o passado e aprendendo com ele, é o futuro que me interessa!

Sachs hoje com 91 anos de idade, dez a mais que eu; visitou nos anos 90 o então famoso Programa Pobreza e Meio Ambiente na Amazônia (POEMA), da Universidade Federal do Pará em cooperação internacional. Ele saiu decepcionado criticando o programa que comparou a "aspirina para tratar câncer". Uma crítica que, no fundo, perdura e se generaliza quando se trata de inclusão social com desenvolvimentos sustentável dirigindo-se ao cerne do sistema mundial como ainda vemos nos dias de hoje, com respeito ao Acordo de Paris de 2015 e à Agenda 2030 da ONU dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Os Marajós não se vem por ai... Nem mesmo a Criaturada se identifica nos romances de Dalcídio ou na obra de Giovanni Gallo, pelo fato de que metade da população de mais de 500 mil habitantes é analfabeta e Cachoeira é apenas um dentre 16 municípios. A rede escolar da sede municipal, que poderia ser direcionada para estudo regular do museu, depois da morte do padre somente por iniciativa individual de uns poucos professores tem pesquisa de alunos no museu. O desafio é achar Cachoeira no mapa histórico do "maior arquipélago fluviomarinho do Planeta"... Referência aos mais municípios da comunidade marajoara. É preciso situar a Criaturada nesta peculiar região amazônica... 

A Amazônia é mais que a Floresta Amazônica, que integra os países amazônicos (Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana francesa). A Amazônia brasileira é composta pelos estados do Acre, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá, Pará, Tocantins e partes do Maranhão e Mato Grosso: o conceito dado pelo Barão do Marajó (José Coelho da Gama e Abreu) na obra As Regiões Amazônicas... No estado do Pará, Marajó, Salgado e Bragantina fazem parte da Amazônia Atlântica e o ensino geográfico deve mostrar este fato aos alunos. Claro, educando os professores continuamente, sendo os primeiros a defender o Museu do Marajó em rede de ecomuseus e museus comunitários das microrregiões.

O Marajó é mais que uma ilha grande na boca do maior rio do mundo... O Marajó é um mundo! O Museu do Marajó precisa se integrar ao Marajó profundo para cumprir sua missão de acordo com o sonho de Giovanni Gallo.


Que nós podemos fazer?

Desunidos nada nós poderemos fazer, se não apenas assistir o museu do padre Giovanni Gallo desabar como o chalé de Dalcídio Jurandir tombou ao chão sob o peso de infinitos invernos e negligências. Os supostos herdeiros do Gallo, se quisessem, poderiam talvez colocar a venda o cobiçado terreno para alguma empresa. O que eu não acredita que queiram de fato, mas seus verdadeiros herdeiros depois de passados os anos irão resistiriam à tentação do negócio?.. Sem dúvida, para dourar a pílula, possíveis compradores do terreno remanescente da OLEICA e lobistas profissionais poderiam dizer, como de costume, que o hipotético empreendimento iria "acabar com a pobreza da gente marajoara"...

Mas esta, então, seria a derradeira derrota de Dalcídio, Gallo e de todos nós herdeiros do sonho impossível da renascença marajoara. Melhor não olhar para trás e nunca mais por os pés na ilha onde nasceu a primeira ecocivilização da Amazônia.

Meu palpite não passa disto que de fato é, um simples palpite. Diria eu primeiramente, escrevam ao Brasil e ao mundo e digam o que pretendem. Mas, não usem vagas palavras e devaneios. Digam objetivamente, concretamente, às autoridades e à sociedade em geral aquilo que a Criaturada precisa e que O NOSSO MUSEU DO MARAJÓ faria, caso tivesse os recursos que o padre nunca teve.

Queixem-se ao Papa, mandem cartas ao Bill Gattes por exemplo, para tratamento de água na zona rural: ninguém sabe que vivemos cercados de água por todos os lados e também sob nuvens carregadas de chuva - a metáfora do Chove nos campos de Cachoeira e de Marajó, a ditadura da água está pronta, esperando interlocutor de prestígio nacional e internacional -, e se apesar de tudo não morremos de sede durante o verão. morremos lentamente por doenças crônicas veiculadas por água sem o devido tratamento. Por último, as águas do rio Arari estão a receber defensivos e fertilizantes de plantation de arroz. 

Se vocês acreditam que o padre dos pescadores fez um museu de "cacos de índio" só pra inglês ver; vocês não leram os livros que ele escreveu ou se leram entenderam poucas coisas. Vejam lá! Esta será talvez a ultima vez que me meto neste assunto. Se eu fosse dizer em que eu mais acredito, daria prioridade: 

1) Protocolo-quadro entre a Associação O Nosso Museu do Marajó e a Prefeitura Municipal de Cachoeira, possibilitando a esta a dotar o MUSEU DO MARAJÓ de orçamento financeiro corrente e representação jurídica com interveniente perante a União, Estado do Pará e organismos internacionais para trato de assunto de interesse do museu; 

2) Mediante o instrumento supracitado, promover concurso para elaboração de projeto contemplando hipótese de repatriamento de cerâmica arqueológica que se acha em museus estrangeiros ou remoção de peças de cerâmica marajoara de museus nacionais para um novo e adaptado Museu do Marajó no futuro; 

3) Reconstrução do chalé de Dalcídio Jurandir no conjunto de equipamentos museológicos do Museu do Marajó para fins de turismo literário, conforme projeto de 2010, que acha no Departamento do Patrimônio Cultural, da Secretaria de Estado de Cultura do Pará (SECULT-PA); 

4) Em convênio com a Associação Brasileira de Ecomuseus e Museus Comunitários (ABREMC), confiar a esta interesses do Museu do Marajó junto ao Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), notadamente criação de extensão ecomuseal do MdM destinada a envolver o município de Cachoeira do Arari em sua totalidade e os mais municípios marajoaras, sobretudo Soure, Salvaterra, Ponta de Pedras e Santa Cruz do Arari na rota gastronômica do queijo do Marajó.

Obrigado a quem leu com paciência estas mal traçadas linhas e, mais ainda, a quem tiver a gentileza de criticar e emendar alguma coisa.