quinta-feira, 20 de junho de 2019

Devemos inventar Extensão Ecomuseológica com a cara e a coragem da Criaturada grande de Dalcídio.

FORTE DE GURUPÁ-FOTO:MARSGUO - GURUPÁ - PA

Forte de Santo Antônio de Gurupá - antiga aldeia de Mariocai, lugar de memória da criaturada amazônida onde, no ano de 1623, sob pavilhão da União Ibérica (1580-1640) com as armas prodigiosas de Portugal e da brava nação Tupinambá se iniciou, de fato, o uti possidetis luso-brasileiro que revogou o tratado de Tordesilhas (1494-1750), célebre "Testamento de Adão"; com a conquista do maior arquipélago fluviomarinho da Terra: consequentemente, do delta-estuário do maior rio do mundo, Pará-Amazonas. Resultado da guerra colonial começada em 1615 com a tomada de São Luís do Maranhão aos franceses e continuada na expulsão de holandeses e ingleses na Amazônia. Enfim terminada a guerra de conquista com a Paz do Mapuá entre Nheengaíbas (Marajoaras), Tupinambás e Portugueses do Pará, em 27/08/1659. Primeiro capítulo da história da Amazônia Marajoara dileta filha da terra dos Tapuias.


A memória do território desperta com o canto do galo na primeira manhã de seu ícone o mais conhecido: o premiado romancista Dalcídio Jurandir, cognominado "índio sutil" por seu confrade Jorge Amado no discurso solene de outorga do Prêmio Machado de Assis (1972). Filho de negra e de branco, nascido no bairrozinho do Campinho, numa casa humilde na vila de Ponta de Pedras, na ilha do Marajó, no dia 10 de janeiro de 1909. 

No lugar onde o maior romancista da Amazônia nasceu, hoje está edificada a Escola de Nível Médio "Ester Mouta". Em sua terra natal o estado construiu também a Escola de Ensino Médio "Dalcídio Jurandir", enquanto já se levantam expectativas da Universidade do Estado do Pará (UEPA) vir a oficializar o campus "Dalcídio Jurandir" de Ponta de Pedras, e na cidade que ele adotou, Cachoeira do Arari; a Secretaria de Estado de Cultura (SECULT), em 2010, tombou a residência onde o escritor viveu sua infância, parte do projeto de reconstrução do Chalé imortalizado no romanceiro por acaso iniciado em Gurupá: começo e fim da odisseia de Alfredo...

Em 1929, jovem Dalcídio Jurandir contava, aproximadamente, vinte anos de idade quando exerceu cargo de secretário municipal de Gurupá por nomeação do interventor estadual no dito município, dr. Rainero Maroja. Terminada a intervenção, Dalcídio ainda se deixou ficar em Gurupá e foi ensinar a ler e escrever aos filhos de um dono de seringal no rio Baquiá. Hoje a área territorial faz parte da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS Itatupã-Baquiá). Lugar de memória das primeiras imaginações e rascunhos do romance seminal Chove nos campos de Cachoeira, refeito dez anos depois na vila de Salvaterra, enquanto Dalcídio recém saído do presídio fascista em Belém retomava seu trabalho de inspetor da instrução pública, no município de Soure ao qual a vila de Salvaterra estava subordinada. 

O escritor diria que do rascunho de Gurupá (1929), que ele carregava como fado; quase nada conservou na elaboração final, em Salvaterra (1939). De fato, se pode dizer que Alfredo (alter ego de Dalcídio) veio à luz entre chuvas e cismas na antiga aldeia dos indígenas Sacacas, após dez anos de gestação, fecundado talvez pelos caruanas das águas do rio Baquiá... Em compensação, a saga de Alfredo iniciada nos vagares da Ilha Grande de Gurupá entre ruínas da belle époque da Borracha; havia, por certo, que terminar em Ribanceira

Sugestão amável do Dia de Alfredo como Ulisses marajoara, inspirado em James Joyce, ao longo de nove romances do ciclo Extremo Norte. Em Salvaterra ainda, o "índio sutil" escreveu Marinatambalo (publicado com título de Marajó), no qual Vicente Salles surpreendeu no papel da infeliz Orminda o velho romanço ibérico Dona Silvana e o nascimento do primeiro romance sociológico brasileiro. O inovador romancista da Amazônia ainda iria surpreender também no extremo Sul, com Linha do Parque, o primeiro romance proletário do antigo Pindorama...

Ora, estou eu a dar voltas, que nem o personagem da Odisseia! Tudo isto é interessante, sem dúvida alguma; mas sem a existência e resistência da Criaturada grande de Dalcídio nossa história seria outra...Ou, como escreveu o padre Antônio Vieira, sem a amizade e lealdade dos famigerados Nheengaíbas o Pará poderia ser de qualquer potência estrangeira que quisesse se apossar da região amazônica. Passados mais de 400 anos da invenção da Amazônia, as invasões de território já não se fazem mais como antigamente, porém por meios mais sutis. 

Esta gente estúrdia já estava aqui há coisa de 5 mil anos atrás! Ela foi capaz de inventar a palafita e os aterros da ancestral Cultura Marajoara há 1.500 anos...  A criaturada estava lá, em 1498, quando Duarte Pacheco Pereira veio ao Pará em viagem secreta e em 1500, antes de Pedro Álvares Cabral "descobrir" o Brasil; quando Pinzón apareceu de repente e atacou a ilha Marinatambalo (Marajó) levando 36 "negros da terra" (escravos indígenas) para a ilha Hispaniola (Haiti), no Caribe. Quarenta e dois anos depois, os dois bergantins de Orellana, vindos da Amazônia equatoriana ao azar, passaram pelas Ilhas debaixo de uma nuvem de flechas para sair ao Mar para ir inventar a lenda das mulheres amazonas na Amazônia... Se já não fosse a estória terrível das índias ocidentais, ainda teria mais esta. E assim o mito colonial pode mais que a realidade da terra e da gente nativa.  

Foram os prelúdios do genocídio do rio Babel (Amazonas) de que fala o professor José Ribamar Bessa Freire. Em fins do século XVI começaram a frequentar as costas do Amapá e a subir o Xingu e o Baixo Amazonas mercadores holandeses, irlandeses e ingleses. Enfim, o Grão-Pará (Amazônia portuguesa) acabou de ser conquistado, escreveu o padre Antônio Vieira ao rei Afonso VI na regência de Dona Luísa de Gusmão, em carta datada de 29/11/1659 e publicada em Lisboa em 11/02/1660; com as pazes dos Nheengaíbas (27/08/1659). Este documento precário não está entre os mais famosos escritos do 'imperador da língua portuguesa', segundo o poeta Fernando Pessoa; profeta do Quinto Império do mundo.

A carta das pazes dos Nheengaíbas, entretanto, passando pela crítica da colonização revela copiosa informação sobre os famigerados "falantes da língua ruim" (nheengaíba) sob a utopia evangelizadora do "payaçu" dos índios. Frequentemente, estudantes e professores de história esquecem que estamos lidando com o cenário colonial do século XVII - primeiro século da invenção da Amazônia! Até aí a crônica colonial registra uma brecha por onde o olhar do velho mundo penetra um novo mundo, mais imaginado que de fato; sobre o "Homem amazônico", que seria visto como "Homo sapiens var. Tapuya", por Alexandre Rodrigues Ferreira, na célebre Viagem Philosophica (1783-1792). Da massagada amazônica Dalcídio Jurandir tirou a massa fina do beiju de seus romances e a ficção faz história.


Posto que devemos ter em mente o território milenar dos aruacos, Tapuya tetama (terra Tapuia) conquistada pela nação Tupinambá em busca da mítica Terra sem Mal - lugar sagrado onde não existe fome, trabalho escravo, doenças, velhice e morte -; chamada Pará-Uaçu ("grande mar") pelos conquistadores, traduzida em língua portuguesa como Grão-Pará e colonizada pelo Reino de Portugal desde 1615 até 1823. 

Nosso ancestral território ecocultural cuja ideia moderna corresponderia perfeitamente, talvez, ao modelo de museu a céu aberto o mais interessante do século XXI. E que museu, então! Área de Proteção Ambiental do Arquipélago do Marajó, futura Reserva da Biosfera Marajó-Amazônia; não fossem as oligarquias da região tão lamentáveis... Um singular território que é espaço do dia a dia de meio milhão de cabocos ribeirinhos, todo memorizável pelo arco de muitas gerações desde tempos imemoriais. Os bens culturais do patrimônio marajoara deveriam permanecer no local de origem, mas infelizmente é incalculável o tanto que se perdeu com a colonização e se esqueceu desde a o genocídio dos cabanos - 40 mil mortos numa população de 100 mil habitantes -, entre 1835 e 1840. 

Então, que a moderna ecomuseologia ajude esta gente a resgatar o espírito da Paz de Mapuá levando-a a declarar o Rio dos Mapuá, na Reserva Extrativista Mapuá, Monumento Natural de relevante interesse etno-histórico. Deste modo, um importante elemento de conservação socioambiental in situ  em socorro da Criaturada grande de Dalcídio; concretude de seu justo desejo de recuperar, tanto quanto possível, a Cerâmica Marajoara pré-colombiana evadida da ilha do Marajó. Revitalização da luta em defesa do patrimônio cultural marajoara tão fragilizada pelo analfabetismo e porque não criam raízes nas camadas populares enganadas e exploradas. Para a ecomuseologia que a gente carece, todavia, o modo de vida das comunidades, o saber adquirido, os objetos, edificações, as práticas tradicionais, usos e costumes, devem ser preservados a todo transe. Mas, não bastam os aspectos culturais para uma extensão educadora e ecomuseológica eficiente. A criaturada grande carece da conservação ambiental com os bichos e as plantas nativas do território de maneira econômica, social e ecológica sustentável. 

Foi Isto que o criador do conceito de ecomuseu, o francês Georges-Henri Rivière ensinou e seu sucessor Hugues de Varine propaga a respeito dos chamados territórios de memória tais como o que vimos de descrever acima. A população é essencial, segundo Rivière, suas ações colocam a comunidade em contato direto com sua história, sua cultura, seu meio ambiente, e sua identidade, desencadeando um processo de valorização do patrimônio cultural e natural. A utopia do "bon sauvage" Tupinambá, que desapareceu aparentemente na jornada de Pedro Teixeira a Quito (1637-1639); não se poderia materializar ao por do sol no espaço plano, todavia através da espiral evolutiva impulsionada pela Ciência e Tecnologia à luz dos Direitos Humanos universais a utopia de Rivière, sim, poderá mobilizar um milhão de aldeias, pouco a pouco, a se aproximar da yby marãey dos profetas caraíbas ou pajés-açus.


Pois, é disto que se trata, quando nós falamos da Criaturada grande de Dalcídio, metaforicamente distribuída nos dez volumes do ciclo Extremo Norte, surdida de um caroço de tucumã (fruto do Astrocaryum vulgare) onde o mito da primeira noite do mundo se ocultava no fundo do rio.



Resultado de imagem para imagem romances Dalcidio Jurandir


/////

domingo, 16 de junho de 2019

AMIGOS DO MUSEU DO MARAJÓ REUNIDOS NA CASA DO POEMA EM BUSCA DE BOM FUTURO PARA CRIATURADA DE DALCÍDIO.

Resultado de imagem para imagem casa do Poema UFPA

A casa do POEMA é sede do programa Trópico em Movimento, da Universidade Federal do Pará (UFPA), na cidade universitário do Guamá; Belém do Para. Está situada à margem do rio de Guamá na confluência com o igarapé Murutucu, tendo sido construída, em 1993, para sediar o Programa Pobreza e Meio Ambiente na Amazônia (POEMA), do Núcleo de Meio Ambiente (NUMA) em cooperação internacional com a Alemanha.


Resultado de imagem para logomarca tropico em movimento



16 de Junho de 2019
40 anos sem Dalcídio - Dia de Alfredo


À distância, no Rio de Janeiro, Dalcídio Jurandir viu que o inventado "museu" do padre Gallo na beira do lago Arari, em Santa Cruz (àquela altura ninguém sabia ser, de verdade, o primeiro ecomuseu brasileiro); e as cooperativas do bispo Angelo Rivatto em Ponta de Pedras, terra natal do escritor de "Chove nos campos de Cachoeira"; foram as melhores notícias que ele recebeu, na longa estada carioca, a respeito da sorte de sua criaturada grande logo após ele ter ganho o ambicionado Prêmio Machado de Assis (1972), da Academia Brasileira de Letras (ABL), pelo conjunto da obra.

Em Marajó, entretanto, as pedras que somos se achavam terrivelmente desunidas depois de breve euforia levantada pela fundação da Prelazia promovida à Diocese de Ponta de Pedras sob ventos descoloniais vindos de Roma na reforma eclesial promovida por João XXIII e Paulo VI. A antiga igreja de Nossa Senhora da Conceição de Ponta de Pedras (1737) dava margem a feias discórdias e mágoas na família missionária marajoara, que a autobiografia de Giovanni Gallo, "O homem que implodiu"; conta e a crônica da memória popular continuada refaz ainda na fala de velhos contadores de causos. 

Hoje, todavia, estão mortos os principais protagonistas desta singular história da gente marajoara. Eis que é tempo de evocar a Oração de São Francisco - não importa se o caboco crê ou não nas virtudes da paz -, carece meditar a respeito da terra e da gente deste mundo de águas grandes. Pegar o azedo do limão e fazer dele uma boa limonada para todos que tem sede de fraternidade: pregar a reconciliação ampla e geral em todas as ilhas grandes e pequenas, de dentro e de fora; da beira mar até à terra firme na Floresta-divisa territorial do Marajó com Cametá e Xingu; fazer aflorar a amorosidade da vida unindo e ligando as pedras que nós somos; para fazer renascer sonhos e esperanças da Criaturada herdeira de 1500 anos de ecoCultura Marajoara.

Em verdade, é disto que se trata da reunião dos Amigos do Museu do Marajó! interessando a cada um e a cada uma marajoara habitantes de mais de 500 comunidades da Amazônia Marajoara!

Para as populações tradicionais a história da reconquista do território da memória poderá ainda ser marcada, entre "cacos de índio"; pela invenção do Museu do Marajó, em 1973, na modesta cidade ribeirinha de Santa Cruz do Arari. Cerca de vinte anos depois, foi a vez da Universidade Federal do Pará (UFPA) brindar os notáveis esforços socioambientais da Diocese com o empolgante programa Pobreza e Meio Ambiente na Amazônia (POEMA), na então preservada agrovila de Praia Grande, a mais próxima comunidade marajoara em relação à cidade grande de Belém do Pará por via fluvial. Esta vila está situada a três quilômetros por via terrestre da antiga "aldeia das Mangabeiras" (vila de Mangabeira), berço histórico do município de Ponta de Pedras em 1686. Lugar que implora para servir de base a um ecomuseu municipal. Com paróquias em Curralinho, São Sebastião da Boa Vista, Muaná, Ponta de Pedras, Cachoeira do Arari e Santa Cruz do Arari (recentemente, São Miguel do Pracuúba) a Diocese de Ponta de Pedras compartilha a Ilha do Marajó (cerca de 50 mil km², um território maior do que os Países Baixos) com a Prelazia do Marajó (sede da prelatura em Soure). As obras sociais da Diocese contavam então com duas dinâmicas cooperativas mistas: uma delas, com perfil de escola de artes e ofícios, era dotada de estaleiro naval, barcos de transporte, marcenaria e carpintaria, olaria, cantina e um setor de turismo que, diversas vezes, deu apoio a visitantes e colaboradores das obras sociais da igreja católica vindos de diferentes partes do país e do exterior atraídos pelas notícias sobre o que estava em movimento nestas partes da grande ilha do Marajó. 

A cooperativa rural havia clara feição kibutziana e estava ela voltada à agricultura familiar em 14 agrovilas organizadas pelo serviço social da Diocese podendo ser referência a um projeto de reforma agrária "ad hoc" para trabalhadores sem terra das próprias localidades marajoaras. Quem é versado na literatura de Dalcídio Jurandir, suscitada através de atividade nas escolas; pode pensar na "reforma agrária" do rio Paricatuba, chance de turismo literário diferenciado, com exemplo do DIA DE ALFREDO; lendo as páginas do romance "Marajó" no percurso das agrovilas da velha "cooperativa da Nella". Considerável oportunidade para a agroecologia nesta cooperativa onde se achavam remanescentes de famílias migrantes do Nordeste refugiadas das grandes secas de fins do século XIX. 

Por último, esta cooperativa filha da Diocese de Ponta de Pedras, que recebeu o POEMA na agrovila de Praia Grande; fechou parceria com a EMBRAPA para elaboração e execução de projeto-piloto de agricultura familiar sustentável, na agrovila de Jaguarajó. Entretanto, apesar das expectativas levantadas erros de direção foram cometidos, tempo e dinheiro desperdiçados e tudo aquilo acabou melancolicamente em nada ou quase nada. Agora, no território da memória que um roteiro ecomuseológico poderia suscitar; restam vestígios daquele breve tempo de boa-venturança. Poderia ter sido melhor? Sem dúvida. 

Entretanto, de qualquer forma resta enorme experiência que não deve ser desperdiçada de maneira nenhuma, tanto pelos acertos quanto por eventuais erros. Ninguém deve considerar insucesso das "Cooperativas da Nella" porque, de fato; não se trata de perda irremediável, mas de etapas em evolução em um processo histórico que tem raízes dos tempos dos chamados Nheengaíbas e das sesmarias dos barões de Joanes, uma peculiar acumulação de conhecimentos que a Universidade, em sentido geral seja ela pública ou particular; deve aproveitar no ensino, pesquisa e extensão de novas gerações desta região singular do Trópico Úmido planetário - portal das regiões amazônicas. 

O POEMA deu lugar ao programa interdisciplinar Trópico em Movimento , que integra institutos da UFPA e conecta ações de relações internacionais no Trópico Úmido na América, África e Ásia. O novo programa interdisciplinar e de extensão universitária da UFPA é legado do inovador programa do passado recente, o qual teve importante experiência na Amazônia Marajoara e agora poderá ter marcante atuação estratégica no delta-estuário amazônico, através dos campi da UFPA em Breves e Soure ou, diretamente, do campus do Guamá, no contexto regional da Agenda 2030 dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). 

Acredito que o programa Trópico em Movimento agregaria muito bem importante componente, caso venha firmar parceria com o Ecomuseu da Amazônia e a Associação Brasileira de Ecomuseus e Museus Comunitários (ABREMC) com a finalidade de estudar a criação do EcoMuseu Casa do Poema. Este faria interface inclusive para fora dos muros da cidade universitária, levando extensão aos bairros da região metropolitana, notadamente os bairros do Guamá e Terra Firme vizinhos ao campus Guamá. 

Falando meramente como cidadão e defensor "perpétuo" da Criaturada grande Dalcídio, vislumbro eu ainda possibilidade da Reitoria da UFPA à qual o Programa está vinculado, autorizar incorporação ao âmbito da casa do Poema do barco-motor Curupira, atualmente no âmbito do Instituto de Geociências (IG), que por desuso está aparentemente se deteriorando na beira do rio. Vindo a ser o velho barco imobilizado permanentemente junto ao conjunto museológico da cidade universitária do Guamá. Desta maneira, o "Curupira" teria sua memória preservada, servindo de atrativo turístico a par da casa do POEMA. 

Os 12 campi da UFPA, reanimados pela mensagem discreta do "índio sutil" acompanhado do "marajoara que veio de longe"; adotariam modo geoestratégico novo de uma universidade multicampi do Trópico Úmido, que eles são de fato e de direito. Todos, sem exceção, abririam suas portas afórum Museu Amazônia integrando vasta rede educadora de cidades, vilas e povoados constituída de pontos de cultura, associações e centros comunitários, escolas de bairro e lugares de memória. 

Pelo acima exposto, pode-se dizer então que o POEMA foi, de certo modo, filho caboco da ECO-92. Ele apesar de idoso não morreu e ainda hoje suscita descendência, planta árvores e escreve livros... Quando o Poema nasceu, era ele um menino sadio, bonito e inteligente veio ao mundo sob ramos de verdes esperanças da Floresta Amazônica, foi parido da Cobra grande no seio das águas amazônicas. Batizado pelo sol e a chuva com este lindo nome que poderia atiçar ainda uma revolução poética, o programa Pobreza e Meio Ambiente na Amazônia (POEMA) tirou da beira da história famílias ribeirinhas que antes nem sonhavam com semelhante oportunidade. Como no caso do projeto Praia Grande, em Ponta de Pedras na ilha do Marajó; para aproveitamento de fibra de coco na indústria de automóveis. 

Claro que, no ponto de vista rasteiro da Criaturada; a emenda foi pior que o soneto... Pena que o verdejante projeto se acabou sem deixar alternativa à altura. Para os benfeitores, contudo, a história é outra: ajuda demais gera dependência com risco da tal sustentabilidade econômica cair do cavalo... 

É normal que quaisquer projetos tenham eles começo, meio e fim. Entretanto, quando empresas, governos ou instituições se envolvem com comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas precisam eles redobrar cuidados de comunicação social adequada em relação às comunidades. Nós devemos lembrar sempre as obras pioneiras do poeta Bruno de Menezes para implantação do Cooperativismo, do antropólogo Nunes Pereira, no Departamento de Caça e Pesca; de Dalcídio Jurandir no Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) e outros, de modo que as populações amazônicas compreendessem a mensagem. Em tempos de hegemonia da ECOLOGIA, mais que nunca, tudo está interligado, lembram-se? Logo, Madre Olvídia Dias, naquele longínquo dia em Ponta de Pedras à margem do rio Marajó-Açu; foi profeta das pedras ligadas ente si... 


PLANTANDO UMA SEMENTE DE IDEIA:
PROJETO ARARI


Vinte anos depois dos inícios do POEMA, o programa Trópico em Movimento poderia talvez reinvestir no desenvolvimento socioambiental da Criaturada grande de Dalcídio - desta feita no município de Cachoeira do Arari, melhor dizendo, na Bacia Hidrográfica do Arari; a bordo da Revitalização do Museu do Marajó e reconstrução da Casa de Dalcídio Jurandir -, donde as duas margens do rio desde suas nascentes no lago Arari até a foz face à ilha de Santana e boca do Caracará. Paisagem cultural da negritude por excelência a par dos quilombos de Salvaterra. 

Para melhor expor minha ideia, dou como sugestão título de Projeto Arari, a um conjuntos de ações que me ocorreram pensar após a reunião dos Amigos do Museu do Marajó realizada na casa do POEMA, no dia 12 último. A cidade de Cachoeira do Arari está localizada à margem esquerda do rio Arari - "rio das araras", aves chamadas de diversos nomes populares da espécie Ara ararauna entre as quais arari, arariúna, araruna... Hoje em dia, as ditas aves araris estão desaparecidas ou são extremamente raras na microrregião Arari, que leva este nome devido à ave símbolo do bioma marajoara no longo passado. 

Lembro-me que em Trinidad e Tobago a espécie Ara ararauna nativa foi extinta, todavia um exitoso projeto de reintrodução da ave trouxe de volta ao país a "arara azul" (arara una, em tupi). Mais recentemente, no Pará o IDEFLOR-Bio conseguiu reintroduzir a Ararajuba (arara amarela) ao ecossistema do Guamá, onde esta especie de ararinha estava extinta. Quer dizer, da mesma forma seria possível uma tentativa de repovoamento dos campos e matas da bacia do rio Arari com araraunas podendo causar, com certeza, impacto positivo em toda Área de Proteção Ambiental do Arquipélago do Marajó (APA Marajó), que foi criada nos termos do Parágrafo 2º, VI, do Artigo 13, da Constituição do Estado do Pará: única unidade de conservação determinada pelo texto constitucional. A APA-Marajó contém em seu território diversas outras unidades de conservação, tais como a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Itatupá-Baquiá (RDS Itatupá-Baquiá) - pelo rio Baquia ou ainda jovem Dalcídio Jurandir andou lecionando aos filhos de um dono de seringal -, a Reserva Extrativista de Mapuá (Resex Mapuá) - em cujo território, em 17 de agosto de 1659, foi feita a paz entre os sete caciques Nheengaíbas de um lado e de outro portugueses e tupinambás no memorável acordo do "Rio dos Mapuaises" celebrado pelo padre Antônio Veira, que deu cabo a mais de 40 anos de guerra nas Ilhas desde a tomada do Maranhão aos franceses -; a Reserva Extrativista Terra Grande - Pracuúba (Resex Terra Grande - Pracuúba) e a Área de Proteção Mata do Bacurizal, no município de Salvaterra. A APA-Marajó é base para candidatura da Reserva da Biosfera Marajó-Amazônia ao programa da UNESCO Homem e Biosfera (MaB)

Portanto, um projeto microrregional tendo por leit motif uma ave nativa, com afinidades ao espírito do MaB, localizado na bacia do rio e lago Arari que deu nascimento à cultura marajoara ancestral (ano 400 depois de Cristo) e viu surgir o primeiro curral de gado (1680); terá condão de despertar as populações locais para a importância de recuperação do seu patrimônio natural, cultural e histórico. Tratar-se-á de um projeto rebocador cujo motor de arranque deve ser a revitalização do Museu do Marajó integrada à reconstrução da casa de Dalcídio em Cachoeira do Arari. Mais valia do turismo cultural e da educação das crianças arariuaras, mobilizando a mídia em geral e a sociedade, gerando notícias e informação sobre a Amazônia Marajoara, de modo a fomentar a vocação econômica do Marajó com vantagem para o ecoturismo de base na comunidade com geração de empregos e renda local. 

Fato que poderia ser realçado na área geográfica do campus da UFPA de Soure, se um projeto como vimos de sugerir acima; houver foco no Museu do Marajó dotado de extensão ecomuseológica baseada na antiga residência do escritor Dalcídio Jurandir - o famoso Chalé do romance "Chove nos campos de Cachoeira" e outras obras do ciclo romanesco tendo o personagem Alfredo como condutor da narrativa - indo a extensão museal em direção a mais de 500 comunidades locais em todo território da mesorregião Marajó. Com certeza que o programa Trópico em Movimento, herdeiro do revolucionário POEMA; não se intimida com o panorama ambiental internacional e interdisciplinar na faixa tropical da América, África e Ásia. Portanto, muito menos não recusará o desafio do "maior arquipélago fluviomarinho do mundo" no delta-estuário do maior rio da Terra.



A arari (Ara ararauna, Linnaeus, 1758), também conhecida como arariuna, araruna, arara canindé, arara-de-barriga-amarela, arara-amarelaarara-azul-e-amarelaararaí e canindé, uma das mais conhecidas representantes do gênero Ara, sendo uma das espécies emblemáticas da Reserva da Biosfera do Cerrado, como poderia igualmente vir a ser da Reserva da Biosfera do Marajó, que desde 2003 está pendente de formalização de candidatura pelo Governo do Estado do Pará. "Arara" provém do tupi a'rara e "Arari" provém igualmente do tupi ara'ri


     


Imagem relacionada




ECOS DA PRIMEIRA REUNIÃO DOS AMIGOS



Dia 12 passado cheguei cedo a casa do Poema, meu bom amigo professor Sergio Munes foi quem possibilitou agendar a reunião ali. Eu estava naturalmente ansioso pela chegada dos amigos e a primeira pessoa conhecida que lá vi chegando foi ninguém menos que o coordenador do Trópico em Movimento, o "teuto-caboclo" Thomas Mitschein. Nós não nos víamos há certo tempo, desde os tempos do POEMA em Ponta de Pedras... Na verdade, naquele tempo, não tínhamos lá muita proximidade. Mas, na manhã do dia 12 foi agradável surpresa e oportunidade como dois velhos amigos prontos a começar logo a falar dos motivos da reunião dos Amigos do Museu do Marajó na casa do Poema. Uma conversa de tão bom astral que contei minha última utopia: fé no conceito de ecomuseu inventado pelo francês Hugues de Verine... Isto que se chama coincidência! Nem que se tivesse marcado horário, Thomas estava curioso para saber mais a respeito do assunto... E por certo a professora Terezinha Resende, do Ecomuseu da Amazônia, iria chegar logo. 

Conforme combinado, cerca das nove horas da manhã chegaram os representantes do Museu do Marajó todos juntos vindos de Cachoeira do Arari (Marajó): o presidente Eduardo Jorge Portal, da associação comunitária mantenedora do museu; Otaci Gemaque, vice-presidente; Lino Ramos, assessor da Secretaria de Turismo e Cultura - Cachoeira do Arari (SETEC) cedido ao museu para prestar assessoria cultural e membros da Irmandade do Glorioso São Sebastião. Thomas Mitschein, gentilmente, conduziu-nos todos ao auditório da casa e nos deu boas-vindas explanando ligeiramente a finalidade do Trópico em Movimento retirando-se em seguida.

A reunião pautou-se pela informalidade. O presidente Eduardo Jorge se apresentou como homem do povo do interior do município, nascido em Retiro Grande, que conquistou mandado de vereador em cinco pleitos chegando a presidir a Câmara Municipal neste momento. Que nestas circunstâncias foi chamado a presidir a diretoria do Museu do Marajó, não por dispor de conhecimento para o cargo, mas compreender a necessidade de manter o patrimônio legado pelo padre Giovanni Gallo ao povo cachoeirense e também sua vontade em aprender a história da referida instituição. Mas, estando ele há pouco tempo no cargo, tendo acontecido o incêndio do Museu Nacional no Rio de Janeiro; por precaução o Ministério Público recomendou vistoria técnica do Museu do Marajó pelo Corpo de Bombeiros. Este achou pontos de risco de incêndio no prédio de exposição, infiltrações no telhado e rachaduras nas paredes, determinam fechamento ao público. A notícia sensibilizou a sociedade e autoridades, tendo o governador do estado, Helder Barbalho e a Secretária de estado de cultura, Úrsula Vidal visitado o museu e assinado compromisso para sua reforma, que ainda não começou. Razão pela qual o presidente Eduardo Jorge aceitou convite para vir a reunião na cada do POEMA reafirmar pedido de colaboração.

Em seguida, o sr. Otaci Gemaque, o amigo Tacica; vice-presidente da diretoria; que conviveu de perto com o padre Gallo durante muitos anos sendo artífice de diversas peças em exposição, que foram confeccionadas sob orientação do próprio padre; fez relato emocionado dos motivos de fechamento temporário do museu e sua lenta decadência após a morte do fundador, em 2003. O assessor cultural Lino, reiterou apelo aos amigos para colaborar na revitalização do museu. Apontou possibilidade de exibição do documentário O Ajuntador de Cacos, filme de Paulo Miranda; como parte de campanha de arrecadação de fundos para o museu de Cachoeira do Arari. 

Sérgio Nunes, assumiu a direção dos trabalhos e pediu organização de pauta e indicação para possível projeto a ser praticado. José Varela ponderou ser oportuno continuar a reunião sem formalidade naquele momento e que posteriormente um apanhado de idéias e sugestões deveria servir de base para discussão mais aprofundada. Era dizer que o conhecimento mútuo dos membros do grupo seria a primeira finalidade da reunião. No que foi acatado.

Em seguida, Paolo Carlucci falou rapidamente de seu trabalho jornalístico como correspondente de imprensa italiana na Amazônia. Que, ao contrário do que lhe fora solicitado, um pedido de ajuda direta ao governo na Itália sob argumento da origem italiana do padre Giovanni Gallo, poderia redundar em perda de tempo. Paolo achava melhor um ou mais artigos em língua italiana divulgando a história do Museu do Marajó. Um direcionamento dos artigos poderá ser feita, notadamente ao Ecomuseu de Turim e ao da Sardenha, dentre cerca de uma centena de outros ecomuseus existentes na Itália que possam vir a se interessar por um possível intercâmbio com o Museu do Marajó e em interessar turistas italianos a viajar a Amazônia a fim de conhecer a ilha do Marajó, particularmente Cachoeira do Arari. 

Então, chegou a vez da professora Terezinha Resende, coordenadora do Ecomuseu da Amazônia e presidente da Associação Brasileira de Ecomuseus e Museus Comunitários (ABREMC) manifestar seu posicionamento. Ela reiterou disposição anterior em ajudar o Museu do Marajó a superar as atuais dificuldades. Enquanto, a professor Lúcia Santana, do Museu Paraensen Emílio Goeldi, coordenadora do Fórum de Museus; discorreu sobre sua recente visita a Cachoeira do Arari a fim de estudar "in loco" possibilidades de parceria do dito fórum com o Museu do Marajó. Informou trabalho em andamento para criação do museu comunitário de Marapanim e pesquisa para formalizar rede de museus locais em todo interior do estado do Pará. Finalizou ser intenção do Fórum apresentar projeto específico destinado a cooperar à revitalização do Museu do Marajó. 

No encerramento da reunião, a professora Graça Santana colocou à disposição da diretoria do Museu do Marajó a sua experiência de anos frente às coleções de antropologia indígena e africana do Museu Goeldi; assim como no projeto RENAS coordenado pela professora Lourdes Furtado; um frutuoso trabalho com populações de pescadores artesanais e coletores de caranguejo no Salgado. Atualmente, a professora Graça Santana se encontra no voluntariado do Ecomuseu da Amazônia, através do qual poderá também colaborar na revitalização do Museu do Marajó. Thomas Mitschein, solicitou, aparte a fim de agradecer mais uma vez a presença dos Amigos do Museu do Marajó e convidá-los a voltar mais vezes.


CACOS DE ÍNDIO, RESTOS DE GENTE DE DIVERSAS DIÁSPORAS, PONTAS DE PEDRAS QUE SE REFAZEM NO FUNDO DO MAR NUMA INFINITA ESPIRAL EVOLUTIVA DO TRÓPICO ÚMIDO EM MOVIMENTO.



Resultado de imagem para fragmentos de cerâmica motivos ornamentais marajoara

"O nosso padre italiano é admirável ... Que qualidades de sábio e repórter! O povo, os bichos, as águas sabem conviver com ele. O padre enfrenta a realidade, não simplifica. Tem uma dose de compreensão da mais alta. Lendo-o fico com as minhas raízes marajoaras estremecendo." (Dalcídio Jurandir, correspondência com Maria de Belém Menezes).



Resultado de imagem para fragmentos de cerâmica motivos ornamentais marajoara





Resultado de imagem para fragmentos de cerâmica motivos ornamentais marajoara



Pela divulgação da Ciência a gente sabe que uma pequena parte de material contém o todo. O oceano é a soma de uma enorme quantidade de gotas de água, casa uma destas formadas de moléculas compostas de H²O... A Terra é antes o planeta Água e o corpo humano feito de 60% de água; nosso cérebro é formado de 80% de água... A Educação deve ser um processo continuado desde o nascimento dos seres humanos. Não sem razão, diz o ditado popular: "morrendo e aprendendo". 

Por acaso, o amigo Vadiquinho deu ao padre Gallo o maior presente que ele poderia esperar (cf. "Motivos Ornamentais da Cerâmica Marajoara", com prefácio de Denise Schaan). Esta a maior herança do Museu do Marajó tendo potencial de formar. juntos ao segmento acadêmico, mestres e doutores capazes de elevar a Cultura Marajoara ao patamar superior da ecocivilização amazônica do futuro.



Imagem relacionada












segunda-feira, 3 de junho de 2019

ILHA DO MARAJÓ; PORTAL NATURAL DA ECOCIVILIZAÇÃO AMAZÔNICA.


Resultado de imagem para foto capa de livro Cultura Marajoara, de denise schaan
obra de Denise Schaan para divulgação da arqueologia na
ilha do Marajó e a importância do Museu do Marajó na ressignificação da Cultura
Marajoara para desenvolvimento sustentável da Amazônia.


"Na grande bôca do rio das Amazonas está atravessada uma ilha de maior comprimento e largueza que todo o reino de Portugal e habitada de muitas nações de índios, que, por serem de lín­guas diferentes e dificultosas, são chamados geralmente Nheengaíbas". (carta do Padre Antonio Vieira ao rei de Portugal, 29/11/1659).


A grande boca do maior rio do mundo, devido às diferentes e "dificultosas" línguas das nações de índios Nheengaíbas habitantes da ilha grande que a atravessa; o padre grande dos índios, Antônio Vieira; chamou de rio Babel, no século XVII, enquanto no século XX o geógrafo Aziz Ab'Saber denomina Golfão Marajoara. O linguista amazonense escreveu a obra incontornável "Rio Babel, a história das línguas na Amazônia", pela qual o leitor pode compreender como a colonização reduziu drasticamente o número da população nativa e extinguiu milhares das tais línguas "dificultosas" faladas no passado na vasta região da Floresta Amazônica, de mais de 7 milhões de km² da América do Sul. 

Desde a concomitante conquista dos Andes pela Espanha e da Hileia amazônica pelo reino de Portugal, a Europa imperial construiu o mito civilizador do "espaço vazio" donde se criou a infame teoria do celeiro do mundo cunhada pelo naturalista alemão Alexandre de Humboldt, em famosa viagem "filosófica" (exploratória de recursos naturais) pela bacia do Orenoco (Venezuela) e Rio Negro (Brasil). Até aí, o chamado rio Babel - Uene, dos aruacos; Paraná-Uaçu, dos tupis; Marañón, dos castelhanos; Grão-Pará, dos portugueses -, ao longo de sete quilômetros, mais a soma de seus tributários formando a formidável teia das águas fluviais que irrigam a maior floresta tropical do planeta; fora ocupada pelo "Homo sapíens, var. Tapuya", na curiosa classificação do naturalista da Viagem Philosophica (1783-1792), Alexandre Rodrigues Ferreira, luso-brasileiro da Universidade de Coimbra, discípulo do naturalista italiano Domenico Varelli. 

Para concepção de uma história das regiões amazônicas no conceito pioneiro do Barão de Marajó, José Coelho da Gama e Abreu; donde logo iremos chegar a Amazônia Marajoara, originalmente demonstrada pela arqueóloga Denise Schaan e o historiador social Agenor Sarraf; é importante reter a influência do pensamento de Vandelli na "Viagem Filosófica", iniciada em 1783 na ilha do Marajó, como se lê na separata "Notícia Histórica da Ilha Grande de Joannes, ou Marajó". 

Descrição

Domenico Agostino Vandelli foi um naturalista italiano, com trabalhos fundamentais para o desenvolvimento da história natural e da química em Portugal nos finais do século XVIII e princípios do século XIX. Foi um dos fundadores e o primeiro diretor do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra. 

De modo que, no momento que a comunidade marajoara e o governo do Estado do Pará unem esforços a fim de revitalizar o Museu do Marajó será interessante pensar num turismo educativo onde visitantes do Arboreto Giovanni Gallo no espaço ecocultural do museu comunitário, tenham oportunidade de suscitar a memória da viagem do naturalista de Coimbra à antiga freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Cachoeira do rio Arari, guiada pelo fundador da Vila de Cachoeira, o inspetor Florentino da Silveira Frade, que segundo Alexandre Rodrigues Ferreira, no dia 30 de novembro de 1756, achou o teso (sítio arqueológico) do Pacoval. Além disto, Florentino Frade é o provável autor anônimo do primeiro relato biogeográfico da região insular do delta-estuário do rio Amazonas, a "Notícia da Ilha Grande de Joannes, sua circunferencia e outras cousas curiosas", escrita no contexto da expulsão dos Jesuítas do Grão-Pará e anterior à "Notícia Histórica" mais de vinte anos, esta após o governo despótico do Marquês de Pombal ter acabado, em 1777. Ano em que, finalmente, as fronteiras coloniais amazônicas entre os reinos da Espanha e Portugal foram regularizadas, conforme o uti possidetis reconhecido no Tratado de Madri de 1750; revogado o Tratado de Tordesilhas (1494). Acordo feito às pressas para evitar a guerra entre as duas monarquias da Península Ibérica, estremecidas pelo descobrimento das Índias Ocidentais por Colombo: deste modo imperial, a Costa-Fronteira do Pará foi delimitada pela margem oriental da ilha do Marajó desde a ponta de pedras dita Itaguari, na foz do rio Marajó-Açu; até a ponta do Maguari, em Soure. Ficaria por acaso a Nova Andaluzia (Amapá e Marajó) no domínio de Espanha. 

A "linha" de Tordesilhas, por um meridiano a 370 léguas para oeste a partir de Cabo Verde; se tivesse sido demarcada cortaria a baía do Marajó em duas bandas: como, por acaso, era em realidade a fronteira étnica entre as nações Nheengaíbas existentes nas ilhas a uns cinco mil anos e a conquistadora nação Tupinambá recentemente chegada no Grão´Pará em marcha rumo ao Araquiçaua (sítio de relevante interesse histórico localizado no Baixo Arari, Ilha do Marajó) em demanda da mítica Terra sem Mal, antes da tomada do Maranhão aos franceses (1615) e colonização portuguesa iniciada com a fundação de Belém do Grão-Pará (1616) em acordo guerreiro entre lusos e tupinambás levando à elevação do Forte de Santo Antônio de Gurupá (1623), durante a guerra de expulsão dos holandeses e ingleses, finalizada cerca de 1647 e consolidada enfim no acordo de Paz do rio Mapuá (Breves), em 27 de agosto de 1659, entre os chamados caciques nheengaíbas (Nuaruaques) - das nações Mapuá, Aruã, Anajá, Guaianá, Pixi-Pixi, Cambocas e Mamaianá -, e o superior das Missões do Maranhão e Grão-Pará, padre Antônio Vieira, representando a coroa de Portugal nos termos da lei de abolição dos cativeiros indígenas de 1655; e o corpo de remadores e arqueiros Tupinambá presentes no ato solene na improvisada igreja do Santo Cristo: hoje na área protegida da Reserva Extrativista Florestal de Mapuá. 

Eis, em linhas singelas, as origens da Amazônia Marajoara, da qual a arqueologia de Denise Pahl Schann dá testemunho e o museu comunitário do padre Gallo se apresenta como a melhor universidade livre que a Criaturada grande de Dalcídio pode desejar. No "apurado" (rendimento) dos outubros da minha vida, acredito eu que será útil saber o caminho das pedras na travessia da nação Tupinambá em busca da Terra sem Mal (utopia selvagem do país do futuro que nossos filhos e netos precisam: onde não existe fome, trabalho escravo, doenças, velhice e morte). 

Descobrir e prevenir armadilhas do caminho desta história ancestral do "homem malvado" (marãyu, marajó), herdeiro da matriarca cobra Jararaca, na iconografia da cerâmica marajoara; animal totêmico que ensinou aos pajés o segredo mortal do curare (veneno de dardos atirados com zarabatana e flechas mortalíssimas que fizeram o bom selvagem tupinambá parar ao longe do paraíso cobiçado, cuja fama dos "índios bravios, desertores e escravos fugidos" retardaram a construção dos currais de gado até o ano de 1680). 

Deus e o Diabo (o Bem e o Mal) se escondem nos detalhes da divina comédia: dentro da cabeça e do coração do homem. Todavia, já dizia o índio no processo da primeira visitação do Santo Ofício (cf. "A Heresia dos Índios", de Ronaldo Vainfas) "Deus criou o homem para dormir e sonhar". O índio morreu enforcado na Bahia de todos os orixás por sentença sumária do inquisidor, o "payaçu" dos índios foi condenado pelo tribunal da Inquisição devido à heresia judaizante do "Reino de Jesus Cristo consumado na terra", utopia evangelizadora mais conhecida como o Quinto Império do mundo... 

Não importa! A gente continua a sonhar com o paraíso reconquistado e o melhor lugar do mundo para redescobrir o espírito destas coisas é o Marajó, portal das regiões amazônicas. Lugar encantado, na fronteira entre o real e a imaginação.