na obra "Notícia Histórica da Ilha Grande de Joanes, ou Marajó" (Lisboa, 1763), do naturalista da Universidade de Coimbra, Alexandre Rodrigues Ferreira; fica-se sabendo que o primeiro sítio arqueológico encontrado pelos colonizadores da ilha do Marajó - o teso do Pacoval -, ocorreu no dia 20 de Novembro de 1756, pelo fundador da vila de Cachoeira (Cachoeira do Arari), capitão Florentino da Silveira Frade.
Coincidência admirável, posto que esta data viria ser celebrada duzentos e tantos anos depois DIA NACIONAL DA CONSCIÊNCIA NEGRA sem que se tivesse lembrança do fato histórico dos primeiros "negros da terra" (escravos indígenas) da América do Sul ter sido arrancados da ilha do Marajó, em fins de janeiro de 1500, pelo navegador espanhol Vicente Pinzón. E, portanto, 20 de Novembro também poderá ser considerado, fundamentadamente, DIA NACIONAL DA CULTURA MARAJOARA iniciada no ano 400 dC.
O autor anônimo da obra anterior "Notícia da Ilha Grande de Joannes" (provavelmente o dito capitão Florentino Frade) informa sobre o achado do teso Pacoval dizendo ter encontrado sobre o aterro com o cemitério indígena, roça de maniva (mandioca) da qual que levou estacas para a vila e os moradores a plantaram com grande vantagem de produtividade da mandioca nativa em relação a que fora trazida de fora da ilha. Este detalhe serve para nos fazer pensar que a 'agroecologia' amazônica é muito mais antiga do que se poderia imaginar.
Educador ou professor? Para muitos são a mesma coisa. Outros, entretanto, divergem quanto a isto: professor seria um profissional sistemática e legalmente capacitado a ensinar, enquanto educador pode ser qualquer cidadão apaixonado pela Educação (assim com "E" maiúsculo), um altruísta em suma, podendo inclusive ser professor formado. Um professor educador, portanto, é a situação ideal do encontro da fome com a vontade de comer, como diz o velho ditado.
Acho eu que o romancista Dalcídio Jurandir expressou magistralmente esta diferença entre professor e educador em sua obra Primeira Manhã. Romance volumoso de um dia só na vida do personagem Alfredo, que disse adeus ao ensino oficial e saiu a flanar pela maior cidade ribeirinha da Amazônia que, enfim, foi uma das suas escolas mais reverenciadas no conjunto de obras premiado pelo Prêmio Machado de Assis (1972), da Academia Brasileira de Letras. No entanto, o "índio sutil" se tornou, por conta própria, referência da educação ribeirinha que a gente carece.
Poderíamos ilustrar esta curiosa diferença pelo exemplo da árvore seringueira (Hevea brasiliensis), que em meio a uma plantation comparável ao professorado oficial; é pesquisada e plantada em linhas retas numa clareira que teve a mata previamente derrubada a fim de abrir espaço à concentração da espécie cobiçada pelo mercado da borracha. Já o educador é como a seringueira num seringal nativo convivendo e competindo por lugar ao sol com espécies diferentes dentro de uma floresta primária preservada. Compreende a metáfora? Ademais, o jovem Dalcídio ensinou primeiras letras a crianças num seringal do rio Baquiá, que hoje é parte da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Itatupã-Baquiá (RDS Itatupã-Baquiá), no município de Gurupá.
A cidade educadora precisa sempre da memória do território, tornando escolas como ecomuseus de fato interligados pelo diálogo constante das gerações na comunidade. De sorte que a criança na escola da comunidade aprenda do seu professor como ser educador de seus pais e avós em casa, que por acaso não foram à escola quando crianças e jovens. E, reciprocamente, mediante esta pedagogia caboca, o trabalho escolar provoque ajuda de avós e pais à criança no exercício de casa. Como isto fosse resposta da família do aluno para a dialética escolar tornando o portador mirim, de fato, educador do professor. Será isto uma utopia? Não há dúvida que sim, uma utopia factível como a estrada de mil léguas começando com o primeiro passo.
Assim sendo, a metáfora da seringueira ajuda a entender a educação ribeirinha de nossos sonhos. Embora sabendo que ela seringueira sozinha não salva a educação de uma escola e muito menos a de um município ou do país inteiro. Porém, dentro de cada professora e cada professor frustrado, mal remunerado, proletarizado, invisibilizado socialmente pela politicagem na esfera educacional e a falta de sensibilidade e de vontade política da população; há a semente viva de um educador que carece abrir espaço na sociedade e ser politicamente cultivada na própria comunidade para crescer e aparecer.
Tratamento e cura do complexo de inferioridade.
Sabe-se que sociedades oriundas de famílias politicamente marginalizadas, padecem muitas vezes de acanhamento, falta de confiança em si mesmo, submissão a exploradores do suor alheio como se fossem amigos e protetores. Este fenômeno psíquicossocial notável no subdesenvolvimento econômico explica a existência de oligarquias dominadoras e a pobreza invencível. Não raro, o ensino meramente tecnológico comete o erro fatal que o uruguaio José Mujica critica nas esquerdas desenvolvimentistas, que formando quadros exclusivamente para o mercado de consumo sonega o desenvolvimento humano integrado à natureza da qual todos viemos e a ela voltaremos após a morte.
O mundo treme diante de um rei que foi escravo, diziam os antigos. Uma pessoa de origem humilde para libertar-se das injustiças e da pobreza precisa vencer a seus desejos de ostentação e vingança a fim de se tornar verdadeiramente emancipado. Se alguém por acaso disser que é fácil e basta seguir bons conselhos, estará enganado ou a querer enganar os outros. Do mesmo modo como no axioma, "Médico, cura a ti mesmo!"; convém desafiar os professores dizendo-lhes: "Professor, educa-te a ti mesmo!"... Da educação política em primeiro lugar, estamos falando.
A professora e o professor politicamente educados, em princípio, são cidadãos os mais bem preparados para exercer cargos políticos numa cidade educadora. Mas, candidaturas a vereador, prefeito municipal e outros nunca deveriam ser fruto de desejo pessoal para afagar o ego adoecido pelo complexo de inferioridade, dizendo a si mesmo; "agora vão ver quem eu sou!". Pelo contrário, uma boa candidatura política deve ser atendimento ao chamado da comunidade... Não importa sair eleito ou não, o que interessa é o processo democrático de começo ao fim. Há derrotas gloriosas e vitórias de Pirro em que a pessoa vende a alma ao Diabo para ganhar um abacaxi infernal.
No caso específico da Amazônia, a Criaturada grande de Dalcídio (populações tradicionais), pede encarecidamente um pacto de professores e professoras educadores em favor da EDUCAÇÃO RIBEIRINHA em vista do Juramento do Pedagogo, que deve ser farol e guia de regeneração política da sociedade dizendo o seguinte:
A gente mora num país equatorial chamado Amazônia.
Nós somos a Amazônia marajoara! Não podemos nos amofinar. Na educação ribeirinha que a gente carece, é preciso quebrar a espinha dorsal da monstra Maria Caninana, a irmã malvada de Cobra Norato! Tal tarefa de Hércules não pode ser enfrentada por uma andorinha só, digo um homem ou mulher sozinha. Essa cobra grande em nossa sociedade figura a poderosa colonialidade que habita águas profundas do inconsciente coletivo nos baixos fundos de nossa cultura regional periférica, parida do seio do velho colonialismo europeu tropicalizado.
O regime colonial já se foi, mas a colonialidade está viva e presente dentro de nossos comportamentos morais, sociais, econômicos e políticos. Os mais fracos pagam o pato e o ódio cresce em desejos de vingança já não se sabe mais por que razão... Quem poderá livrar nossas crianças de um destino cruel repetindo a frustração de seus pais e avós? Quem poderá dizer desta água não beberei quando a oportunidade do mal se oferece, se não houver leis democráticas e cumpridores das leis. São os cidadãos forjados pela Educação através de seus professores, respeitados por pais de alunos e apoiados por políticos democraticamente eleitos pela sociedade, que poderão mudar o jogo.
Oxalá os professores se dediquem à boa Política, de corpo e alma! Seja como candidatos, seja apoiando candidatos capazes de regenerar a política suja ou, principalmente, ensinando pela prática os princípios que Aristóteles ensinou a respeito da Política: a Pólis, cidade... Só a escola pode educar e curar a cidade adoecida... Não tenhamos medo de "perder" eleição, melhor não ser eleito onde os vencedores rendidos e vendidos a interesses obscuros. Pois a "derrota" do justo é começo de mudança.
Os problemas que a sociedade vem atravessando neste instante podem ser enfrentados a partir de um compromisso sincero pela educação integral envolvendo a cidade toda com ênfase na escola: o diálogo entre gerações dentro de casa deve ir à escola, já pela fundamental participação da professora e do professor enquanto pais e filhos egressos de uma família. Já pela indispensável participação do aluno e da aluna que vem do seio de uma família da sociedade local. Já pela necessária participação de mães e pais de alunos, ou cidadãos interessados na solução dos problemas da comunidade.
A agroecologia amazônica nutriu a Cultura Marajoara desde o berço da roça e da aldeia. Graças aos trabalhos de pesquisa arqueológica da norte-americana Anna Roosevelt e da brasileira Denise Schaan sabemos que a pesca primitiva de gapuia (secando a água em pequenas represas e de maré baixa para pegar o peixe do mato à mão) deu origem à ecocultura na ilha do Marajó. O peixe do mato matou a fome do índio coletor mariscador e de infinitas aves aquáticas da hoje chamada Amazônia Marajoara. Daí a aldeia e a roça de mandioca, com que o neolítico das terras baixas do trópico americano deixou para trás cerca de 5 mil anos de nomadismo.
O Nosso Museu do Marajó é patrimônio da gente marajoara. Uma bancada de representantes do povo poderá unir a comunidade de 16 municípios num acordo pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da AGENDA 2030. Se não nos unir nada de interessante irá acontecer na farsa da história.